
O cenário do varejo brasileiro, historicamente dominado por grandes shopping centers e pelo comércio de rua tradicional, testemunhou nas últimas duas décadas a ascensão de um modelo de negócio que redefiniu o conceito de conveniência: o strip mall. Importado do modelo norte-americano, onde é uma presença onipresente nas paisagens suburbanas, o strip mall brasileiro adaptou-se, evoluiu e consolidou-se como um ativo imobiliário estratégico e uma solução cada vez mais relevante para as necessidades do consumidor moderno.
A Origem
Os primeiros strip malls surgiram no Brasil de forma tímida entre o final dos anos 1990 e o início dos anos 2000. Inicialmente, eram vistos como uma versão simplificada dos shopping centers. A fórmula era básica: uma fileira de lojas voltadas para um estacionamento frontal, com acesso direto e sem as áreas comuns climatizadas e de lazer dos shoppings tradicionais. Localizados em bairros residenciais de classe média e alta nas grandes capitais, seu propósito era claro e direto: oferecer um conjunto de serviços essenciais com máxima agilidade.
O mix de lojas inicial era previsível e funcional, focado em resolver as necessidades cotidianas do morador do entorno. As âncoras eram, tipicamente, uma farmácia, uma padaria de maior porte, uma lavanderia e, por vezes, uma locadora de vídeo – um retrato de uma era. A proposta de valor era puramente transacional: estacionar, comprar o necessário e sair. Não havia a pretensão de criar um destino de lazer ou entretenimento; o grande diferencial era a praticidade, um antídoto para o trânsito caótico e a dificuldade de estacionar no comércio de rua.
A Transformação
O que transformou esse modelo de nicho em um segmento em expansão foi a confluência de mudanças urbanas, sociais e econômicas. Quatro pilares principais sustentam esse crescimento:
- A Dinâmica da Urbanização: A expansão das cidades brasileiras e a crescente densificação de bairros residenciais criaram uma demanda latente por comércio e serviços de proximidade. O tempo gasto em deslocamentos tornou-se um fator crítico na qualidade de vida, fazendo com que a conveniência de ter tudo “à porta de casa” se tornasse um atributo altamente valorizado. Os strip malls preencheram perfeitamente essa lacuna, oferecendo uma solução de varejo capilar e de baixo atrito.
- Mudança no Comportamento do Consumidor: A jornada de compra do brasileiro diversificou-se. Enquanto os grandes shoppings continuam sendo destinos para compras planejadas e lazer, surgiu a necessidade de compras rápidas e pontuais, as chamadas “compras de reposição” ou “on-the-way”. O consumidor passou a valorizar a eficiência e a otimização do tempo. A pandemia de COVID-19 acelerou drasticamente essa tendência, reforçando a importância do comércio local e de ambientes abertos, além de consolidar o strip mall como um ponto estratégico para serviços de click-and-collect e delivery.
- Atratividade para Lojistas e Investidores: Para os varejistas, os strip malls oferecem uma alternativa atraente aos shoppings tradicionais. Os custos de ocupação – aluguel e condomínio – são significativamente menores, permitindo a operação de lojas com menor metragem e maior rentabilidade. A burocracia para instalação também costuma ser mais simples. Para os investidores e desenvolvedores imobiliários, o modelo apresenta vantagens como um ciclo de construção mais curto, menor investimento inicial (CAPEX) em comparação com um shopping center, e um retorno sobre o investimento mais rápido. A resiliência do setor, ancorada em serviços essenciais, também provou ser um atrativo, com taxas de vacância historicamente mais baixas que outros segmentos do varejo.
- Interiorização do Desenvolvimento: Com a saturação relativa dos grandes centros urbanos, o crescimento econômico e demográfico de cidades de médio porte no interior do país abriu uma nova fronteira para os strip malls. Essas cidades, com poder de consumo crescente, mas muitas vezes carentes de uma infraestrutura de varejo moderna e organizada, tornaram-se um terreno fértil para novos empreendimentos, que levam conveniência e um mix de marcas qualificadas para populações antes desassistidas.
O strip mall brasileiro de hoje pouco se assemelha aos seus precursores. O modelo passou por um profundo processo de amadurecimento e sofisticação, transcendendo a mera funcionalidade para abraçar a criação de experiências e a integração com a comunidade.
A arquitetura e o design tornaram-se elementos centrais na proposta de valor. Os projetos atuais buscam criar ambientes mais agradáveis e convidativos, utilizando paisagismo, mobiliário urbano, iluminação planejada e fachadas modernas. A preocupação com a experiência do usuário é visível: calçadas mais largas, áreas de convivência ao ar livre, paraciclos e, em alguns casos, pequenos playgrounds. O objetivo não é mais apenas facilitar uma transação rápida, mas incentivar a permanência e criar um senso de lugar, um ponto de encontro para a comunidade local.
Essa evolução estética reflete uma mudança estratégica: o strip mall deixou de ser apenas um centro de serviços para se tornar um “centro de conveniência qualificada”.
No próximo artigo falaremos sobre a evolução do mix, oportunidades e tendências do setor.