História dos Shopping Centers no Brasil

Shopping Centers no Brasil – Século 20

1.  PORQUE SHOPPING CENTERS?

Muitas pessoas ainda continuam achando que um Shopping Center moderno é um conceito novo e revolucionário dentro do planejamento urbano e do desenvolvimento social. Ao contrário, trata-se, porém, de uma das mais antigas instituições conhecidas pela humanidade.

A partir dos primeiros relatos da história, quando o homem desceu das árvores e começou sua vivência em pequenos grupos, sempre havia, pelo menos, uma área especial onde efetuava suas compras, realizava suas trocas e se socializava.

Quando vivia afastado, essa área especial era um posto de intercâmbio, em uma encruzilhada ou em algum outro ponto de fácil acesso no vai-e-vem entre grandes distâncias.  Na medida em que os homens começaram a agrupar-se em aldeias e povoados, os postos de intercâmbio transformaram-se em mercados públicos ou em bazares e, finalmente, quando as povoações cresciam e davam lugar às cidades, surgia o Distrito Comercial Central ou “o Centro” de cada cidade.

Além de seus aspectos sociais, não é mero acidente que, historicamente, a maioria do comércio sempre se concentrará numa área de fácil acesso.  A razão é simples e lógica:  a natureza humana.

A venda de seja-lá-o-que-for, requer não somente um vendedor, mas também a parte mais decisiva e importante da transação, o comprador.  E como compradores – todo mundo – por razões de nosso próprio ser, procuramos viver de um modo mais cômodo e menos complicado possível.

A conveniência do homem poder comprar ou adquirir a maior parte dos artigos de que necessitava em um único lugar, numa localização central, era um dos primeiros e mais diretos meios pelo qual procurou descomplicar sua vida, que estava se tornando cada vez mais complexa.  A validade dessa lógica perdura até hoje e é a chave fundamental para o desenvolvimento da indústria de Shopping Centers.

Nos Estados Unidos e no Canadá, a concentração do comércio e de serviços no Centro ou no Distrito Comercial Central da cidade, satisfazia as necessidades até o fim da década de 1940 / início da década de 1950; na Europa, até a metade da década de 1960 e no Brasil e em outros países latino-americanos, até o fim dos anos 60, quando a ampla difusão de posse e de uso do automóvel particular se infiltrou como parte rotineira na vida cotidiana.

O constante aumento dos números absolutos de automóveis e, consequentemente, as ruas sempre mais congestionadas, assim como os poucos locais para estacionamento, fizeram com que todos os centros das cidades se tornassem caóticos e, efetivamente, indesejáveis.

A razão para a criação e manutenção dessas áreas – a conveniência da concentração de lojas e serviços em um só lugar, e com facilidade de acesso – deixou de existir.

Ao contrário, na maioria das grandes cidades e mesmo em muitas das cidades de menor porte, “o Centro” tornou-se um lugar decididamente inconveniente.  Ir ao centro, ou especialmente dirigir um carro até lá, é uma experiência desgastante, irritante e um desperdício de tempo que, hoje em dia, todo mundo faz o possível para evitar.

Uma das soluções para este dilema do congestionamento urbano foi, naturalmente, construir novas áreas que possuíssem todas as conveniências dos antigos e históricos “Centros”, mas que incluíssem também provisões para o automóvel: o Shopping Center.

2.  O QUE É UM SHOPPING CENTER?

Por tudo que possa parecer, um Shopping Center é simplesmente um novo “Centro”, porém planejado, projetado, e, o que é mais importante ainda, administrado de tal forma que atenda não somente os problemas atuais, mas também preveja o futuro, a fim de garantir sua contínua viabilidade como ponto comercial e, acima de tudo, a contínua conveniência dos seus clientes.

A definição formal de um moderno Shopping Center é a seguinte:

  • de uma concentração planejada de lojas e serviços;
  • de uma localização central dentro de uma determinada Área de Influência;
  • de fácil acesso, por carro ou transporte público, de todas as partes de sua Área de Influência e mesmo de fora da própria Área, na medida possível;
  • que forneça abundante, conveniente e planejado estacionamento;
  • administrado e promovido como uma só unidade.

Um ponto importante que, porém, deve ser notado quando se considerar investir num Shopping Center é que, independente do seu tamanho, um Shopping nada mais é do que uma plataforma, um edifício, um veículo para abrigar e facilitar operações varejistas – a venda de mercadorias e serviços – e que o seu sucesso financeiro dependerá totalmente do volume de vendas realizado por seus locatários-comerciantes.

Shopping Center é negócio de varejo.  Financeiramente é um negócio de caixa.  O desempenho do negócio é medido pelo fluxo de caixa, e para se ter um fluxo de caixa positivo, é preciso ter um alto índice de vendas.

A fim de se conseguir manter esse alto índice de vendas, após inaugurado, o desenvolvimento de qualquer shopping center novo deverá seguir um processo que inclua estudos minuciosos a respeito de sua localização, acessos, concepção e deverá quantificar, com precisão, o mercado disponível na sua futura Área de Influência.

Sem esses estudos iniciais, que definirão se existe mercado suficiente para um novo shopping center, ou não, seus empreendedores e/ou investidores poderão estar montando um futuro fracasso, em vez do empreendimento bem sucedido que todo mundo deseja. 

3.  O COMEÇO NO PAÍS – SHOPPING CENTER IGUATEMI

A era de Shopping Centers no Brasil formalmente começou em Novembro de 1966, com a inauguração do Shopping Center Iguatemi, em São Paulo.

Desenvolvido pelo pioneiro empreendedor, Alfredo Mathias, com fundos arcados por milhares de investidores, através de um sistema de vendas de quotas “porta a porta”, o Iguatemi, no início, com 25.425m2 de Área Bruta Locável – hoje com 47.322 m2 – não tinha nada do estrondoso sucesso que hoje em dia o tornou tão famoso.

Ao contrário, os anos iniciais do Iguatemi foram marcados pela quase total rejeição de seu conceito inovador e facilidades (na época) modernos.

No fim da década de 60, comercialmente, a Rua Augusta reinava quase que absoluta e a nova presença do Iguatemi foi caracterizada pela ausência de consumidores / compradores, pela regularidade com que lojas fechavam e pela ausência de retorno financeiro não só para os lojistas, como também para a legião de investidores que havia comprado – por alguma razão – os títulos dos vendedores ambulantes do visionário Alfredo Mathias.

Ficou patente para muitos lojistas do Iguatemi, na época, que o Brasil simplesmente ainda não estava preparado para Shopping Centers e que, mesmo contando com uma pequena loja de departamentos (Sears), cinemas, amplos estacionamentos e uma considerável gama de lojas e serviços, seus planos e esperanças para ganhos comerciais e financeiros rápidos, com o Shopping, obviamente foram precipitados.

Os ganhos e o retorno financeiro eventualmente viriam para os que tinham meios para aguentar os anos de desespero, mas isso somente quando o conceito de Shopping Center começou a ser finalmente aceito no país, e após consideráveis investimentos adicionais, por parte dos novos administradores, tanto em melhorias físicas, como em melhorias administrativas e promocionais também, depois que o velho Alfredo Mathias foi forçado a vender o empreendimento, em 1978. 

Vale aqui ressaltar uma menção honrosa ao Super Centro Boqueirão, primeiro centro comercial da América Latina, inaugurado em 15 de outubro de 1965 na cidade de Santos – SP, com uma ABL de 5.500 m2 totalizando mais de 140 lojas. Considerada sua estruturação de lojas vendidas à época, enquadra-se mais como empreendimento imobiliário do que como shopping center.

4.  A DÉCADA DE 70 – IMPLANTAÇÃO DE UMA NOVA INDÚSTRIA

Não obstante a existência do Iguatemi, a indústria nacional de shopping centers efetivamente começou – mas lentamente – no decorrer da década de 70.

Durante esses 10 anos, foram inaugurados 8 novos shoppings, com um total de 254 mil metros quadrados de Área Bruta Locável (ABL).  Mas, mesmo assim com aquele conceito novo e moderno de organização varejista, com exceção da razoavelmente bem sucedida inauguração do Shopping Center Matarazzo (que é, na realidade, apenas um tipo de “Strip Center” coberto, ancorado por um supermercado, com uma faixa de lojas “satélites” em frente aos caixas – o precursor do formato das lojas Carrefour de hoje), do Center Um em Fortaleza (outro exemplo de “Strip Center coberto”, inaugurado em 1974) e do Shopping Center Ibirapuera, que gozaram de sucesso desde seus primeiros dias; os outros 5 Shoppings inaugurados neste período, não encontraram aquele espetáculo de vendas antecipadas.

O público brasileiro custou a assumir e adotar o Shopping Center como seu.

Em ordem cronológica, com exceção do Center Um, que não é filiado da Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE), os shopping centers inaugurados na década de 70 foram os seguintes:

Shopping Center Mês de Inauguração Observações (Baseadas na Década de 70)
Conjunto Nacional Brasília(Brasília, DF)  11/71 Mesmo contando com sua excelente localização, os anos da primeira etapa do Conjunto Nacional não foram coroados de pleno sucesso.  Porém com as sucessivas ampliações (em 1975 e 1978), o projeto tornou-se muito bem sucedido.
Com-Tour Londrina(Londrina, PR) 10/73 Destacava-se apenas por ser chamado “Shopping Center”.  Na realidade era uma galeria horizontal, com estacionamento.
Shopping da Gávea(Rio de Janeiro,RJ) 05/75 Idealizado e construído pela Vector Engenharia, foi o primeiro shopping do Rio de Janeiro.
S.C. Matarazzo(São Paulo, SP) 10/75 Como indicado anteriormente, o Shopping Center Matarazzo não passava de um “Strip Center” coberto, que é um super ou hipermercado, com uma faixa de lojas “satélites”, instaladas de frente para seus caixas.  Não obstante, teve aceitação razoável, desde seu início.
Continental S.C.(Osasco, SP) 10/75 O Continental é um shopping center que foi desenvolvido com o objetivo de valorizar os terrenos à sua volta.  É um projeto muito bem construído, de 3 pisos.  Na sua inauguração, contava com uma loja âncora da rede japonesa Yohan (que posteriormente fechou) e algumas das melhores lojas satélites da época. Não obstante, sua localização difícil, dentro de uma Área de Influência de classe operária e as dificuldades de acesso, nada ajudou para salvar o projeto.
S.C. Iguatemi Bahia(Salvador, BA) 12/75 O Shopping Center Iguatemi Bahia é um dos mais bem sucedidos shoppings do país.  Mas, seus primeiros anos de operação foram também difíceis. Os baianos achavam que era muito distante do centro e, devido a sua complexidade (três andares, com transporte vertical) e a falta de muitas opções de compra desejáveis, sofreu muito.
S.C. Ibirapuera(São Paulo, SP) 8/76 Desenvolvido com muita promoção, o Ibirapuera foi o primeiro shopping do país a gozar de sucesso imediato.  Continua sendo um dos shoppings de destaque em São Paulo.
BH Shopping(Belo Horizonte,MG) 10/79 3 anos após a inauguração do Ibirapuera e 14 anos após a abertura do Iguatemi São Paulo, o país ganhou seu oitavo shopping center. O BH Shopping foi profissionalmente desenvolvido, contava com todos os requisitos básicos (fácil acesso, amplos estacionamentos, lojas âncora, Malls bem planejados) e apresentou a primeira praça de Fast Food planejada do país. Também como os baianos, com seus pensamentos em relação ao Iguatemi Bahia, foi considerado “longe demais pelos mineiros e, como conseqüência sofreu durante seus primeiros anos. Somente após o acréscimo do Hipermercado Carrefour foi que o BH Shopping iniciou sua bem sucedida trajetória.

 

Mesmo que nesse período, o progresso tenha sido lento e, às vezes não muito animador, as bases para a verdadeira indústria de shopping centers no país estavam sendo firmemente formadas e os hábitos de consumo de milhares de brasileiros sendo radicalmente mudados.

Assim, no decorrer dos últimos 3 anos dessa década, iniciava-se o planejamento e desenvolvimento de projetos que formariam o núcleo de uma verdadeira explosão de shopping centers durante a década de 80.

Como resultado, apenas nos 3 anos de 1980 a 1982, foram inaugurados mais shoppings, do que os inaugurados durante a década inteira de 1970-1979 (14 com um total de 522 mil m2 de ABL, contra 7 com um total de 254 mil m2 de ABL, durante a década de 70 e 1 com 25.425m2 – Iguatemi São Paulo, durante a década de 60).

Enquanto as mudanças nos hábitos do consumidor e nas práticas de varejo eram profundas, a mais significativa ocorreu no relacionamento entre os donos (empreendedores e investidores) e os inquilinos dos shoppings (lojistas).

A introdução, nos contratos de locação (e aceitação por parte dos lojistas) de cláusulas de aluguel percentual (quando o lojista pagaria, acima de um mínimo estipulado, uma porcentagem pré-estabelecida sobre suas vendas, como aluguel) não foi apenas uma novidade, mas também uma maneira encontrada para que os empreendedores e eventuais investidores conseguissem se proteger das perdas ocasionadas pela inflação, como também participar do crescente sucesso de cada shopping, garantindo e aumentando, assim, seu eventual retorno financeiro.

O efeito dessa inovação foi o de tornar os shoppings nacionais mais atrativos ainda, tanto para empreendedores, quanto para os investidores, incluindo os institucionais, os quais iniciaram sua investida na indústria durante a década seguinte, pois na década de 70, fontes de financiamento para shopping centers eram difíceis de se encontrar.

A maioria dos shopping centers, nesta década, foi financiada com fundos da Caixa Econômica, normalmente com prazos de 10 anos, com carência de 2 anos durante a construção.  Não obstante, por ser um tipo de empreendimento novo, conseguir fundos da Caixa exigia que se enfrentasse muita burocracia. 

5.  A DÉCADA DE 80 – MATURAÇÃO DA INDÚSTRIA 

Mesmo com todos os contratempos, ocasionados pelos sucessivos planos econômicos malogrados, a indústria de shopping centers amadureceu durante a década de 80 e tornou-se parte do cotidiano dos brasileiros.

No início da década, os empreendedores nacionais ainda tinham muito que aprender sobre as técnicas de desenvolvimento e de operação de shopping centers e, portanto, continuaram importando consultores com tecnologia e experiência americana e européia até meados da década, quando o Brasil tornou-se auto-suficiente em conhecimentos e tecnologia de shopping centers.  A tecnologia Brasileira de shopping centers é hoje um produto de exportação para outros países.

Começando com a inauguração do Rio Sul Shopping Center, no Rio, em Abril de 1980 (um projeto tipo “multi-uso” por ser um empreendimento que concentra, em um só lugar, um shopping center junto à uma torre de escritórios, muito bem sucedido, por sinal), como indicado anteriormente, os projetos planejados no fim da década de 70 foram rapidamente inaugurados no período de 1980 a 1983.

Dos projetos inaugurados nesta época, alguns após seu período natural de maturação tornaram-se os shopping centers de maior expressão do país.  Os mais destacados são:

Shopping Center Mês de Inauguração Observações (Baseadas na Década de 80)
S.C. Iguatemi Campinas(Campinas, SP) 5/80 No início, ele era maior do que o seu mercado comportava e, portanto, sofreu durante seus primeiros anos.  Com o crescimento do mercado, a adequação de melhoria do seu Tenant Mix e o aperfeiçoamento de sua Administração, tornou-se o shopping center com maior êxito no interior de São Paulo.
Shopping Center Recife(Recife, PE) 10/80 Os pernambucanos custaram a aderir ao hábito de shopping center.  Se este foi o resultado da natural reticência desse povo em provar coisas novas, ou se foi em decorrência da localização do shopping – na época pouco privilegiada (ao lado de uma comunidade, e numa área apenas no início do seu espetacular desenvolvimento – o bairro de Boa Viagem) – o Shopping Center Recife também levou tempo para se firmar.  Não obstante, após os primeiros difíceis anos, sofreu diversas expansões e reinou absoluto, no mercado, por 13 anos, até a inauguração do 2o. shopping da cidade, o Shopping Guararapes, em Novembro de 1993, no município de Jaboatão dos Guararapes, contíguo à Recife.
Ribeirão Shopping(Ribeirão Preto,SP) 05/81 Com a inauguração do RibeirãoShopping, dia 5 de maio de 1981, surgiu em Ribeirão Preto um novo vetor de desenvolvimento urbano. A fazenda de cana-de-açúcar que na época parecia muito distante da cidade, quase no distrito de Bonfim Paulista, deu lugar a um moderno shopping com 100 lojas, praça de alimentação cinemas e ambiente climatizado.
Shopping Center Eldorado(São Paulo, SP) 9/81 Inaugurado com muita fanfarra, o Shopping Eldorado gozou de um sucesso inédito durante os primeiros 2 ou 3 anos.  Não obstante, a modernização e aprimoramento do seu vizinho, o Shopping Iguatemi (apenas a 1 km de distância), resultou num declínio vertiginoso de sua popularidade.  Apenas recentemente, como resultado de um programa de reforma e introdução de novas atrações, adequação do seu Tenant Mix e profissionalização da sua Administração, é que o empreendimento vem adquirindo um novo direcionamento.
Barrashopping(Rio de Janeiro, RJ)    10/81 Na época, o Barrashopping também era considerado “longe”, mas estava localizado na área de maior desenvolvimento da cidade, com fácil acesso de quase todas as partes do Rio de Janeiro.  Na década de 90, com sua expansão conta com mais de 74.600 m2 de Área Bruta Locável e 550 lojas. Quando inaugurado estreou uma grande área de lazer, que foi a primeira no país e que, hoje em dia, tornou-se praxe na maioria dos shoppings nacionais.  O conceito brasileiro de “áreas de lazer” está sendo aproveitado em diversos shoppings norte-americanos de menor porte, além dos grandes shoppings como o de West Edmonton, no Canadá e o Mall of América, em Minneapolis, Minn, que foi concebido em torno de um grande parque de diversões, o Camp Snoopy.
S.C. Iguatemi Fortaleza(Fortaleza, CE) 4/82 Apesar da existência do Center Um, o Shopping Center Iguatemi Fortaleza foi o primeiro shopping center moderno, da cidade, e desfrutou de razoável sucesso desde o início.  Foi ampliado e solidificou sua posição de liderança, no Estado.
Morumbi Shopping(São Paulo, SP) 5/82 Devido a sua localização e ao profissionalismo com o qual foi desenvolvido, o MorumbiShopping sempre gozou de uma posição de destaque no mercado paulista.  Após sucessivas expansões é considerado, hoje em dia, um dos melhores shoppings do país.
S.C. Iguatemi Porto Alegre(Porto Alegre, RS) 4/83 Como o primeiro shopping center do Rio Grande do Sul, e também devido ao profissionalismo com o qual foi desenvolvido, o Iguatemi Porto Alegre gozou de sucesso instantâneo, o qual continua até hoje, apesar da concorrência de outros shoppings inaugurados na cidade, durante os últimos anos.

 

Outros shoppings de destaque e de sucesso foram inaugurados durante a década, como, por exemplo, o Müeller Shopping Center (9/83),em Curitiba (um Shopping no centro da cidade que aproveitou uma construção antiga, preservando suas características arquitetônicas), o Parkshopping (11/93), em Brasília (que levou mais de 3 anos para se firmar no mercado, mas hoje é um sucesso total), o Center Norte (4/84), em São Paulo(talvez o maior sucesso em shopping center do país), o Norteshopping (7/86) no Rio de Janeiro, o Shopping Barra (11/87), em Salvador, Bahia, e o Shopping Iguatemi Maceió (4/89), entre outros.

Nesta década, também, apareceram os primeiros “Shoppings Especializados”: o Rio Design Center (12/83) e o Casa Shopping (9/84), no Rio, com exceção do Center Norte, esses tipos de empreendimentos tiveram lenta aceitação por parte do público e, como consequência, retornos financeiros pouco alentadores.

No final da década, o país contava com 56 shopping centers oficialmente reconhecidos pela ABRASCE, sem contar com diversos outros projetos de menor escala, não filiados.  Em termos de Área Bruta Locável, foram construídos 1.294.643m2 entre 1980 e 1989. 

6.  A DÉCADA DE 90 – REFORMAS E NOVAS FORMAS DE VAREJO 

Na primeira metade da década, o varejo no Brasil atravessou o seu período mais turbulento dos tempos recentes; grandes organizações de varejo enfrentaram enormes dificuldades financeiras, empreendimentos planejados durante a década de 80, abriram suas portas para um público que experimentou perda de poder aquisitivo de mais de 30% em valores reais, em curto período de tempo, e o capital de longo prazo praticamente tornou-se inacessível à grande maioria dos empreendedores.

Como conseqüência desse período de turbulência, que acompanhou a própria turbulência econômica do país, a indústria de shopping centers foi obrigada a repensar seus dogmas e parâmetros e adaptar-se a um país sensivelmente mais pobre, onde a eficiência assumiu papel preponderante nas decisões empresariais, opondo-se ao período anterior em que sofisticação e modelos importados eram a norma.

O varejo brasileiro, nesse período, sofreu profundas mudanças em sua própria estrutura, devido a dois fatores principais: 1) a quebra da confiança entre fornecedores e revendedores, ocorrida principalmente em função do cancelamento das encomendas de Natal em 1990 e 1991, deixando todos os fabricantes, do pequeno ao mega empresário, em sérias dificuldades; 2) o altíssimo custo real do capital, que obrigou todos os participantes na cadeia de distribuição a trabalharem com estoques perto de inexistentes.

Como conseqüência, nota-se no varejo brasileiro na área de confecções e moda em geral, a preocupação generalizada dos fabricantes em assumirem controle de parcela significativa de seus canais de distribuição de modo a não mais dependerem inteiramente de terceiros para a colocação de seus produtos.

Essa preocupação manifesta-se no surgimento generalizado de grandes redes de varejo que são, na realidade, rede de distribuição direta de fabricantes. As lojas multimarca perdem espaço e aquelas exclusivas de “grifes”, passam a ter a importância das antigas âncoras em qualquer novo empreendimento.

Durante esse período, consolidam-se aquelas redes de varejo, i.e., fabricantes, que melhor souberam aproveitar-se da combinação “nome – preço – produto”, com rápida expansão e presença nos pontos de vendas onde estava o público. Exemplo perfeito dessa época foram as redes Pakalolo, M Officer, Forum e outras, as quais, aliadas à rápida expansão do sistema de franquia, souberam preencher o vácuo deixado no mercado pelas antigas lojas multimarca, tais como Casas José Silva, Garbo, Marie Claire e outras.

A preocupação do fabricante em chegar até o varejo atingiu toda a escala de fabricantes; naqueles de maior porte, essa preocupação manifestou-se no fenômeno da criação de “lojas de fábrica”, cujo exemplo mais marcante, tanto pela sua novidade quanto pela sua escala, foi da “Vila Romana”.

Em 1991, a Vila Romana, em face de enorme estoque sem giro, resultado de previsões otimistas e pedidos cancelados, viu-se obrigada a subverter seu sistema de distribuição e “queimar” várias marcas através da divulgação maciça de sua loja de fábrica, junto ao público consumidor. Apesar desta loja existir há vários anos, até então sua função exclusiva era a desova de pequenos estoques obsoletos; em 1991, a função da loja de fábrica passou a de tornar-se um dos principais canais de distribuição da empresa, assumindo importância capital para a viabilização da continuidade econômico financeira da empresa.

Uma vez dado o exemplo da Vila Romana, muitos outros fabricantes seguiram celeremente seu exemplo e iniciaram suas próprias operações de “lojas de fábrica”, entre os quais destacam-se a Levi’s, Camelo, Alpargatas, Cori, etc.

Sob o pretexto de comercializar pontas de estoque, fabricantes grandes, médios e pequenos passaram a controlar fatias significativas de seus canais de distribuição ao consumidor, ao ponto de, atualmente, dedicarem parte de sua capacidade produtiva à manufatura de “pontas de estoque” para abastecer suas lojas de fábrica.

Outro fenômeno marcante deste período de crise foi a consolidação das chamadas “pronta entrega”, atividade marcadamente brasileira oriunda da necessidade de manutenção de baixos estoques pelos lojistas.

As confecções médias e pequenas sempre mantiveram estoques à disposição dos lojistas, de maneira que o abastecimento das pequenas lojas pudesse ser feito diariamente, se necessário. Com a alta contínua do custo de capital, esta atividade expandiu-se a ponto de sustentar empreendimentos muito grandes exclusivamente voltados a este mercado, tais como o “Mart Center”, com mais de 700 lojas de pronta entrega, Brás Center, Pólo Atacadista de Moda, Fashion Center, etc. À medida em que a crise se aprofundou, mais estes estabelecimentos foram importantes como escoamento da produção dos pequenos e médios fabricantes.

Além dos pequenos lojistas, também surgiram nessa época as chamadas “sacoleiras”, senhoras do interior e da periferia que compram mercadorias nas lojas de pronta entrega e revendem às suas amigas, a domicílio. Estima-se que nos níveis médio e baixo de mercado, as “sacoleiras” chegam a representar 40% de todo o movimento do pequeno e médio confeccionista.

Para a indústria de shopping centers, os fenômenos citados acima tiveram várias conseqüências e desdobramentos:

Em primeiro lugar, as redes de fabricantes com grife própria passaram a desempenhar papel fundamental no “tenant mix” de qualquer empreendimento, a ponto de avalizarem, ou não, o sucesso comercial de um empreendimento junto a outros lojistas e fabricantes de menor reputação ou poder comercial. Da mesma maneira que há alguns anos seria impensável o desenvolvimento de um shopping center sem a presença confirmada de várias âncoras, hoje em dia é absolutamente necessária a presença de nomes do porte de “Forum”, “M. Officer”, “Viva Vida” e alguns outros, para garantir o sucesso comercial do empreendimento já na sua fase de comercialização aos lojistas.

Por outro lado, a combinação das lojas de fábrica e lojas de pronta entrega levou ao surgimento do que classificaríamos aqui como “shopping de descontos”, onde o conceito de shopping center tradicional é adaptado para acomodar condições mais espartanas, fabricantes e distribuidores sob a estratégia de “preço mais baixo”. Tal como nos Estados Unidos, esse novo centro de compras é definido pelo conceito de “varejo de valor”, onde o consumidor quer encontrar produtos de qualidade, a preços sensivelmente mais baixos que nos shopping centers tradicionais.

Infelizmente, à época, o termo “outlet center” assumiu, no Brasil, um significado diverso daquele que encontramos nos Estados Unidos. Enquanto lá “outlet” significa “escoamento” de produção, no Brasil, graças à grande inventividade de alguns empresários locais, este termo passou a significar o empreendimento que abriga diversos stands temporários de qualquer lojista, fabricante ou revendedor que se disponha a pagar o aluguel semanal, sem qualquer compromisso do empreendedor com perenidade, qualidade, “tenant mix” ou proteção ao consumidor.

Esse tipo de empreendimento, originou-se em São Paulo e, devido a seus baixos custos de implantação (na realidade, nada mais que a adaptação sumária de galpões antigos) rapidamente proliferou-se por diversos pontos, principalmente na cidade de São Paulo.

Nos cinco anos da era “Collor – Itamar”, a indústria de shopping centers dedicou-se então a duas atividades principais: o planejamento de novos empreendimentos com a característica de “varejo de valor”, empreendimentos os quais estão agora começando a entrar em operação e a reforma e readequação dos shopping tradicionais, com raras exceções.

Nestes quatro anos, vimos poucos shopping centers novos, do modelo tradicional, serem planejados e desenvolvidos, sendo exemplo notório o Shopping Plaza Sul, na cidade de São Paulo; entretanto, praticamente todos os shoppings existentes na cidade de São Paulo sofreram algum tipo de reforma ou “expansão” durante esse período.

Um fator impulsionador desse movimento foi também a oportunidade apresentada pela desativação das cadeias Sears e Dillard’s, que colocaram à disposição dos empreendedores grandes áreas de vendas a baixo custo de investimento.

O efeito dessas reformas e expansões é que houve melhor adequação do espaço de vendas às novas necessidades do varejo e realidade do mercado. O tamanho médio das lojas diminuiu e hoje é comum encontrar-se no mercado lojas de 30 a 40m2 de área; as grandes lojas âncora foram em parte substituídas por muitas pequenas lojas e grande parcela destas são, na realidade, o braço do varejo de pequenos e médios fabricantes.

No espaço anteriormente ocupado por grandes âncoras como a Dillard’s, no Shopping Iguatemi e Sears, no Shopping Morumbi, hoje apresentam-se quase duas centenas de lojistas independentes, não mais submetidos totalmente ao grande poder de compra dos magazines.

Neste capítulo de varejo, é importante notar a presença do novo componente de varejo no mercado brasileiro, qual seja o atacadista que chega ao público consumidor através dos “clubes de descontos” (warehouse clubs). Esta forma de varejo espartano, baseado exclusivamente em preço, conta no Brasil com um representante, a rede “Apoio”, do grupo mineiro Sindi. Desenhado a competir diretamente com os hipermercados, objetiva fazer o produto chegar às mãos do consumidor pelo menor preço possível, através do corte de custos fixos e diminuição de margens.

Assistimos à chegada do “Sam’s Club”, da rede Wal Mart, ao Brasil. Se o exemplo do sucesso obtido pela rede Apoio é medida para a atuação do Sam’s Club neste mercado, então pode-se prever que o varejo de produtos de primeira necessidade e Hipermercado está para sofrer mudanças no Brasil.

Para a indústria de shopping centers, esta mudança no varejo viria reforçar a presença dos shoppings de descontos em nosso cenário. Enquanto Hipermercados foram âncora importante para os shopping centers tradicionais, estas formas de varejo de desconto oferecem aos empreendedores a oportunidade de ancorarem novos empreendimentos em clubes de desconto e, assim, atraírem importante parcela de público.

Shoppings de descontos só funcionam se realmente vierem a oferecer ao público, preços realmente atrativos. A questão que se colocou para a indústria de shopping centers no Brasil é se estes novos empreendimentos são realmente capazes de oferecer custos competitivos, aos lojistas e aos consumidores, a ponto de fazê-los o ponto referencial de compras para o consumidor. Porém isto não se concretizou. Devido a falta de excedente de produção e de lojistas e operadores profissionais neste segmento, o shopping de desconto acabou confundido com shopping de lojas amadoras, oferecendo ao público produtos baratos e de qualidade e procedência inferiores. Talvez no futuro, dependendo do desenvolvimento econômico do país, volte a ser um segmento que mereça melhor análise e exploração dos investidores.

A segunda metade da década foi marcada pelo desenvolvimento de grandes áreas de lazer nos shopping centers. Estas áreas foram previamente planejadas nos novos projetos e foram obtidas, nos shoppings já existentes através da reestruturação de ABL desocupada, seja devido a shopping centers inicialmente superdimensionados, seja devido a grandes operações que encerraram suas atividades.

Estas áreas de lazer vieram como grandes operações de cinema no modelo cineplex norte-americano, trazidas principalmente pelas gigantes Cinemax e UCI, enquanto a NAI ainda finaliza estudos para a sua entrada no Brasil, ou não.

Instalaram-se também nos shopping centers complexos múltiplos de lazer, englobando numa única operação boliche, restaurante, simuladores e entretenimento para todas as idades, com o objetivo de servir a família como um todo.

Shoppings temáticos de lazer também foram desenvolvidos e implantados, porém não obtiveram o sucesso esperado, sem conseguir se sustentar com as receitas geradas prática e unicamente pelas operações de entretenimento.

Porém, a grande característica do fim da década é a saturação dos espaços para a montagem de shopping centers, não do ponto de vista mercadológico, mas do ponto de vista físico. Em outras palavras, praticamente todos os terrenos em situação indicada, à época, para a implantação de shopping centers, seja devido ao fácil acesso ou à localização privilegiada, já estão ocupados por empreendimentos comerciais.

Esperamos que esse texto ajude ao entendimento dos que atualmente desenvolvem trabalhos sobre a evolução desse segmento.